Prevenção ao suicídio: combatendo o tabu

Dr. Angelo Bannack

Atualizado há 9 meses

Falar sobre o suicídio ainda é um grande tabu. Muitas pessoas sofrem em silêncio sem ter com quem conversar a respeito de seus problemas e angústias. Por isso a importância do setembro amarelo, que é o mês voltado para a prevenção do suicídio.

Neste texto você vai conhecer estatísticas sobre o suicídio, entender quem tem maiores chances de o cometer, bem como formas de prevenir e onde procurar ajuda. No final você vai encontrar alguns mitos sobre o suicídio.

Boa leitura.

Sobre o suicídio

Cerca de 700 mil pessoas cometem suicídio anualmente no mundo, o que representa cerca de 1% de todas as causas de morte mundiais.

No Brasil em 2022 foram 16.262 registros oficiais. Isso dá cerca de 8 suicídios para cada 100 mil habitantes, o que representa um aumento de quase 12% em relação ao ano anterior.

A provável explicação para o aumento está na pandemia da covid, com o aumento do desemprego, do luto por perdas de amigos e familiares, bem como de todos os elementos que aumentam os fatores de risco para o suicídio, como ansiedade, solidão e estresse.

A preocupação é grande sobre o tema pois em 2010 a taxa no Brasil era de pouco mais de 5 casos para cada 100 mil habitantes, sendo que o aumento maior é entre os jovens.

Estima-se que cerca de 80% de quem comete suicídio tem acesso a um médico da atenção primária um ano antes da morte, sendo que apenas 25 a 30% tem consulta com um psiquiatra nesse período.

Não há dados que confirmem que fazer rastreamento para suicídio reduza a mortalidade, mas estas estatísticas sugerem que os médicos da atenção primária são fundamentais para abordar e identificar potenciais situações de risco.

O Setembro Amarelo

Em 1994, o americano Mike Emme, um jovem de 17 anos tirou a sua própria vida em seu Mustang amarelo. Durante seu funeral seus pais distribuíram cartões com fitas amarelas e com mensagens de apoio para quem estivesse enfrentando das mesmas angústias que Mike.

A história conta que o Mustang 1968 foi restaurado e pintado de amarelo pelo próprio Mike. A campanha fita amarela iniciou desde então nos Estados Unidos e se espalhou mundo afora.

No Brasil a campanha Setembro Amarelo surgiu no final de 2014 por iniciativa do Centro de Valorização da Vida em parceria com outras instituições. É uma campanha de conscientização sobre a prevenção do suicídio. Qualquer um pode participar do movimento sendo a principal ação a de criar espaços para o diálogo, como a publicação desse artigo, por exemplo. Palestras, cartazes, rodas de conversas em escolas ou unidades de saúde, caminhadas, enfim, qualquer ação que sucinte um diálogo a respeito do suicídio é bem vida. Iluminar espaços com a cor amarela, para chamar a atenção para a questão, também é uma iniciativa importante.

Não há uma lei federal em vigor, apesar de existir um projeto de lei definindo que o mês de setembro é o mês de prevenção ao suicídio. E na falta de uma lei maior, alguns estados e municípios criaram suas próprias leis para isso.

Quem tem maior risco de cometer suicídio?

Identificar quem tem maior risco pode ajudar na prevenção e na mudança de comportamentos.

Disparado o maior risco de cometer suicídio é a tentativa prévia. Em segundo lugar vêm as doenças psiquiátricas como esquizofrenia, depressão e transtorno bipolar.

Mas, apesar de menores riscos, outros transtornos mentais também podem favorecer ao suicídio, como ansiedade e sintomas psicóticos (quando a pessoa tem alucinações – vê ou ouve coisas imaginárias).

Pessoas que se sentem sem esperança estão entre as de maior risco. Os solteiros também têm maiores chances do que os casados. Os homens têm o dobro de chance do que as mulheres.

Outros fatores de risco são: ter sofrido abuso sexual, realizado serviço militar, portador de dor crônica ou doenças graves, genética (ter pais ou irmãos que cometeram suicídio), acesso à arma de fogo, abuso de substância (álcool e drogas) e uso de antidepressivos.

Uma questão importante é que há grandes indícios de que a divulgação sensacionalista de casos de suicídio na mídia, especialmente de celebridades, aumentam a taxa de suicídio nas semanas seguintes ao fato. Este é o principal motivo por haver a recomendação entre os profissionais de saúde de não incentivar e divulgar casos de suicídio.

Tem como prevenir o suicídio?

O principal fator protetor é o suporte social e da família. Ter amigos, conviver em sociedade, participar de grupos religiosos, de música, pintura, esportes, enfim qualquer atividade coletiva que traga satisfação é fator de proteção para o suicídio.

A religiosidade por si só é fator de proteção. E o suicídio é menor entre gestantes e em quem tem filhos.

Quando e onde procurar ajuda

Os principais sintomas que se deve ficar atento é ao isolamento e as mudanças de hábitos, como a perda de interesse por atividades de que gostava, alterações no sono e no apetite, piora no desempenho escolar ou no trabalho e descuido com a aparência.

Pessoas que dizem frases como “queria estar morto” ou “prefiro desaparecer” também podem indicar necessidade de procurar ajuda.

A ajuda pode vir de um amigo, da escola, da igreja, dos parentes, mas também de um profissional treinado, como um médico ou um psicólogo.

No Brasil a mais importante fonte de ajuda imediata é o Centro de Valorização da Vida (CVV), através do telefone 188, gratuito e disponível 24 horas por dia. Há ainda um chat e outros canais de contato na página da CVV.

A conversa por si só pode fazer muita diferença, mas em muitos casos é necessário tratar alguma eventual condição de saúde mental. O acompanhamento com um psicólogo costuma ser fundamental, mais ainda para quem já tentou suicídio.

No SUS, além do contato direto com as Unidades de Saúde, os Centros de Apoio Psicossocial (CAPS) têm um papel fundamental. São espaços de convivência para pessoas com transtornos mentais graves e que oferecem diversas atividades, além de apoio psiquiátrico e psicológico gratuitos. Alguns CAPS permitem acesso direto para qualquer pessoa, outros precisam de um encaminhamento da Unidade de Saúde mais próxima.

Mitos sobre o suicídio

Devido ao grande tabu sobre o tema, existem inúmeros mitos que o rodeiam. Confira alguns deles:

  • Quem fala que vai se suicidar não comete o ato. O fato é que muitas pessoas que cometeram suicídio já haviam falado de forma implícita ou explícita sobre seus sentimentos ou planos.
  • Apenas quem tem transtorno mental é que comete suicídio. Apesar de os transtornos mentais serem a principal causa do suicídio, pessoas que estão passando por grandes dificuldades também estão susceptíveis à ideação suicida, chegando a tentar tirar a própria vida.
  • Todo mundo que fala em suicídio quer mesmo morrer. Muitas pessoas deprimidas que têm planos de suicídios se sentem aliviadas quando conseguem conversar com alguém que ofereça ajuda. Falar sobre suicídio não a encoraja a suicidar-se.
  • O suicídio e é sempre um ato impulsivo. A maior parte das tentativas de suicídio é planejada, muitas vezes por semanas ou até meses. Alguns casos são impulsivos, mas mesmo nestes, a intenção costuma estar presente há algum tempo.
  • O suicídio é causado pelo estresse. O estresse pode até ser um gatilho para o ato, mas não é a causa para o suicídio.
  • Quem morre por suicídio é egoísta e fraco. Na verdade, o suicídio é uma atitude tomada para acabar com uma dor insuportável e que nada tem a ver com a força ou egoísmo da pessoa.
  • Não há nada a fazer para evitar o suicídio. A prevenção é perfeitamente possível quando se oferecem alternativas e tratamento adequado para o indivíduo.
  • Quem fala que quer se matar só quer chamar a atenção. Em alguns casos falar que quer cometer suicídio ou até mesmo tentar, é um pedido de ajuda.
  • Todos que pensam em suicídio querem mesmo morrer. Muitas pessoas que têm ideação suicida não querem realmente morrer, mas acreditam que a morte é a única solução para seus problemas.
  • Quando alguém fala em suicídio devo mostrar que vai ficar tudo bem. É claro que esse é o pensamento mais óbvio que se passa na cabeça de alguém que quer ajudar. Mas fazer comparações ou tentar amenizar o problema pode acabar invalidando o sofrimento do outro, o que pode aumentar ainda mais a sensação de isolamento e incompreensão.

Conclusão

O suicídio é um problema real e que precisa ser discutido. A campanha Setembro Amarelo surgiu justamente para isso. Apesar de a tentativa prévia ser o principal risco para o suicídio, as doenças mentais são as mais importantes causas e que podem ser tratadas. Ter suporte familiar e da sociedade é de extrema importância para prevenir o suicídio, mas não deixe de procurar ajuda médica, psicológica ou ainda do Centro de Valorização da Vida.

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Um forte abraço.

Dr. Angelo Bannack - Médico de Família

Dr. Angelo Bannack

Sou um médico que gosta de escrever, curte tecnologia e que valoriza a ciência como o caminho para a nossa evolução. Como médico de família, atendo em meu consultório particular em Curitiba e em consultas domiciliares, ajudando as pessoas a manterem-se saudáveis, com check-ups regulares, orientações e contribuindo no processo de diagnóstico e tratamento da grande maioria dos problemas de saúde.

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