Hanseníase (lepra)

Dr. Angelo Bannack

Atualizado há 10 meses

A hanseníase ou lepra, é uma doença causada por uma bactéria que afeta a pele e os nervos, causando, além de manchas, perda de sensibilidade da região acometida. Apesar de ser uma doença muito antiga, ainda é um problema de saúde mundial, e bastante disseminada em nosso país. Neste artigo você vai saber como a doença é transmitida, quando suspeitar de alguma mancha ou outro sintoma no corpo, como é feito o diagnóstico, o tratamento e como avaliar as pessoas que convivem com quem teve a descoberta da doença recente.

O que é hanseníase?

A hanseníase, muito conhecido por lepra, é considerada a doença mais antiga do mundo. É causada pela bactéria Mycobacterium leprae, que afeta principalmente a pele e os nervos. E como nervos eu não estou me referindo a você ficar mais nervoso ou agitado por conta da doença, mas sim os nervos responsáveis por transmitir as sensações de calor, frio, tato, dor e permitir os movimentos do corpo.

Dependendo da pessoa, podem aparecer manchas na pele ou então perda da sensibilidade na região afetada. A bactéria tem preferência por partes mais frias da pele, por isso é mais comum em mãos, pés, braços, pernas e no rosto.

Caroços ou espessamento dos nervos podem ser observados, além de sensação de formigamento dos dedos das mãos e pés, ou ainda a completa perda de sensibilidade para o calor, podendo se queimar sem perceber nem sentir dor. 

É uma doença que ainda é considerada um problema de saúde pública no Brasil. Em 2020, foram reportados à Organização Mundial da Saúde (OMS) cerca de 130 mil novos casos da doença no mundo. Desses, 18 mil foram notificados no Brasil, algo próxima a 14% dos casos do mundo.

Como se pega hanseníase?

A transmissão não é bem compreendida, pois a bactéria é difícil de cultivar em laboratórios. Tudo indica que a transmissão é pelo ar. Mas não basta uma simples respirada no ar de uma pessoa que tenha a doença. É necessário um contato prolongado com alguém doente para se contaminar.

Por isso a transmissão é mais comum entre pessoas que vivem ou trabalham no mesmo ambiente por vários meses ou anos. E mesmo assim, estima-se que a maior parte das pessoas sejam imunes à hanseníase, não se contaminando mesmo que convivam com pessoas doentes e sem tratamento. Porém, a genética parece ter um caráter importante na doença. E parentes de primeiro grau de pessoas doentes (pai, mãe e irmãos) podem ter mais chances de adoecer.

A vacina BCG (Bacilo Calmette–Guérin), que é aquela que deixa uma cicatriz no braço, e é aplicada para evitar formas graves de tuberculose, também ajuda a reduzir a contaminação da hanseníase.

Quando suspeitar de que eu possa estar com hanseníase?

Qualquer mancha na pele que tenha alterações de sensibilidade (perda de sensação de temperatura, toque ou dor) é suspeita para hanseníase e merece uma avaliação médica.

Além disso outros sinais e sintomas que você deve procurar uma avaliação médica:

  • Sensação de formigamento, choques ou cãibras nos braços e nas pernas. Um dos nervos mais acometidos é o que enerva a região dos dedos menores das mãos (mínimo, anular e parte do dedo médio), por isso formigamento nessa região da mão deve ser investigada.
  • Nódulos ou caroços em qualquer parte do corpo, especialmente se não tenham nenhum sintoma.
  • Redução ou queda de pelos do corpo, especialmente na região das sobrancelhas.
  • Redução ou ausência de suor em uma área da pele.
  • Queimaduras ou machucados no corpo sem que a pessoa perceba.

Caroços e manchas são muito comuns e têm mais chances de ser outra doença do que hanseníase. Porém, na ausência ou redução da sensibilidade no local, é melhor investigar.

A primeira sensibilidade perdida é a de temperatura (3 meses antes da tátil), seguida da tátil e por fim da motora (perda de força e da movimentação dos membros afetados).

Como o médico faz o diagnóstico da hanseníase?

Como a bactéria da hanseníase é difícil de cultivar e nem sempre encontrada em biópsias, associada ao fato de que a hanseníase é uma doença relativamente comum em nosso país, o Ministério da Saúde considera como portador da doença qualquer pessoa que tenha um ou mais dos critérios a seguir:

  • Lesões e/ou áreas da pele com alteração de sensibilidade térmica e/ou dolorosa e/ou tátil;
  • Espessamento de nervo periférico, associado a alterações de sensibilidade e/ou de movimentação;
  • Presença da bactéria Mycobacterium leprae, confirmada em exame de esfregaço ou de biópsia de pele.

É claro que para ter o diagnóstico é necessária uma avaliação com um médico. E como o tratamento da doença no Brasil é feita em postos de saúde, os dermatologistas e médicos de família que atuam em unidades de saúde são os que estão mais acostumados em tratar e diagnosticar a hanseníase. 

Para fazer o diagnóstico, além da história, o médico vai investigar a perda da sensibilidade de temperatura, tátil e de força e movimento em todas as regiões suspeitas. A inspeção de toda a pele à procura de manchas sugestivas é necessária.

Para facilitar o tratamento e acompanhamento da doença, o Ministério da Saúde segue os critérios da OMS, classificando a doença em dois subtipos (paucibacilar e multibacilar) de acordo com o número de machas ou lesões encontradas no momento do diagnóstico:

  • Paucibacilar: Quando existem 5 ou menos lesões na pele, desde que sem bacilos (bactérias) detectáveis em esfregaços ou biópsias de pele. .
  • Multibacilar: Quando existem 6 ou mais lesões ou se existem bacilos detectáveis em esfregaços ou biópsias de pele. 

Como é feito o tratamento da hanseníase?

O tratamento consiste em medicamentos que precisam ser tomados por pelo menos 6 meses para que tem hanseníase na forma paucibacilar e por 12 meses para a forma multibacilar.

São 3 medicamentos (Rifampicina, Dapsona e Clofazimina) que precisam ser tomados uma vez por mês no posto de saúde (dose supervisionada). Além disso os medicamentos Clofazimina e Dapsona precisam ser tomados diariamente em casa.

São medicamentos caros e nem sempre disponíveis nas farmácias, tendo que obrigatoriamente se fazer o tratamento e o acompanhamento numa unidade de saúde.

Uma vez iniciado o tratamento o paciente já deixa de transmitir a bactéria, não precisando se afastar de suas atividades diárias.

Além da medicação, é necessário um acompanhamento com um médico por pelo menos a cada 3 meses durante o tratamento, quando é realizado um exame físico completo à procura de sinais de evolução da doença, especialmente para verificar o acometimento de nervos (neurites) ou de reações ao tratamento (reações hansênicas), que nesse caso necessitam de tratamento com corticoides ou anti-inflamatórios para evitar sequelas.

*Procure um médico ou a unidade de saúde na qual está fazendo o tratamento no caso de qualquer sinal ou sintoma novo.

Apesar de raro, em alguns casos a doença pode ser resistente ao tratamento. A consulta periódica visa também avaliar essa possível resistência. Nesse caso é necessário a troca da medicação por outros antibióticos.

Uma vez terminado o tratamento com a medicação, e na melhora ou estabilização dos sinais e sintomas, o paciente está livre da doença. Porém, é importante manter consultas no mínimo anualmente para o acompanhamento de alguma lesão ou mancha que ainda tenha permanecido mesmo após o tratamento. Não há um período bem estabelecido, mas alguns estudos recomendam de que se mantenha uma avaliação anual com um médico por pelo menos 3 a 5 anos após o tratamento.

Outros cuidados

Como a hanseníase pode deixar sequelas se não tratada, principalmente deformações ou perda de mobilidade, é importante um acompanhamento multidisciplinar contando com o apoio de psicólogas, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e outros especialistas.

Uma outra questão importante é o autocuidado. Quem está em tratamento para hanseníase deve verificar periodicamente a pele de todo o corpo à procura de novas manchas, bem como ficar atento a perdas de sensibilidade em outras regiões do corpo.

O cuidado com os pés deve ser primordial, de forma a evitar feridas ou machucados que podem infeccionar, especialmente quanto os pés são acometidos pela doença. Usar calçados macios e inspecionar os pés diariamente é imprescindível.

E se não tratar?

O maior problema de não tratar a hanseníase são as consequências que a doença causa. Perda de movimento ou deformidades em dedos das mãos e dos pés podem acontecer na doença não tratada ou diagnosticada muito tardiamente. Dificuldade para andar, pegar objetos e até paralisia do rosto pode acontecer quando a doença não é tratada. Perda de sobrancelhas, cílios, nariz caído e perfuração da cartilagem do nariz são outras consequências a longo prazo.

Quais os cuidados com familiares e demais pessoas do convívio?

Todos os contatos diretos de pessoas com o diagnóstico de hanseníase devem ser avaliados. O Ministério da Saúde recomenda que toda e qualquer pessoa que tenha morado com o doente nos últimos 5 anos anteriores ao diagnóstico são considerados contatos.

Para os contatos há indicação de vacinar com BCG apenas se a pessoa tomou menos de 2 doses da vacina. 

Todos os contatos devem ficar atentos para sinais e sintomas sugestivos da doença e procurar ajuda imediatamente no caso de qualquer mancha na pele ou perda de sensibilidade. 

Conclusão

A hanseníase é provavelmente a doença mais antiga no mundo. É causada por uma bactéria e caracterizada pela presença de manchas e nódulos na pele com alteração da sensibilidade. É uma doença que tem cura, mas que se não tratada por levar a deformidades e perda permanente da mobilidade de pés e mãos. O tratamento está disponível no SUS e é feito com a combinação de 3 medicamentos. Dois deles são tomados diariamente em casa, sendo que os 3 juntos são tomados uma vez por mês num posto de saúde. Pessoas que moram na mesma casa que o paciente diagnosticado com hanseníase devem fazer uma avaliação com um médico e tomar a vacina BCG caso não tenham tomado 2 doses quando crianças.

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Um forte abraço.

Dr. Angelo Bannack - Médico de Família

Dr. Angelo Bannack

Sou um médico que gosta de escrever, curte tecnologia e que valoriza a ciência como o caminho para a nossa evolução. Como médico de família, atendo em meu consultório particular em Curitiba e em consultas domiciliares, ajudando as pessoas a manterem-se saudáveis, com check-ups regulares, orientações e contribuindo no processo de diagnóstico e tratamento da grande maioria dos problemas de saúde.

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